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Violência Policial – Sugestão de Leitura: Favela Nova Brasília vs. Brasil (2017)

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Violência Policial – Sugestão de Leitura: Favela Nova Brasília vs. Brasil (2017)

Maria Carolina Ribeiro

O caso Favela Nova Brasília (2017) foi o primeiro caso, condenando o Brasil, a tratar sobre violência policial no contexto de operações perpetradas em favelas no Rio de Janeiro. Configura-se, portanto, paradigmático não só nesse sentido, mas também por apresentar recorte de violência de gênero.

Em 18 de outubro de 1994 e 8 de maio de 1995, ocorreram duas operações policiais, que acarretaram a execução extrajudicial de 26 pessoas. Na primeira operação, os policiais cometeram violência sexual contra três mulheres, duas delas crianças. Todas as mortes foram registradas como “resistência à prisão resultante em morte dos opositores” e “tráfico de drogas, grupo armado e resistência seguida de morte”.

O caso não trata diretamente da violação do direito à vida no que tange aos 26 homicídios, nem da violação do direito à integridade pessoal que concerne aos atos de violência sexual, posto que a Corte IDH não possui competência ratione temporis para conhecer de fatos anteriores ao reconhecimento da jurisdição da Corte pelo Brasil, que ocorreu em 10 de dezembro de 1998. Contudo, o próprio Estado reconheceu tais condutas de seus agentes. Assim, a Corte IDH volta-se para as violações de direitos humanos das investigações e ações penais contra os envolvidos, ainda pendentes à época.

Desse modo, considerou-se que uma investigação penal sobre uma morte decorrente do uso da força policial em intervenções deve ter a garantia de um órgão investigador independente dos agentes envolvidos, implicando a ausência de relação institucional ou hierárquica, como uma autoridade judicial ou o Ministério Público. Ademais, as investigações realizadas não cumpriram com a devida diligência exigida em casos de execuções extrajudiciais e graves violações de direitos humanos, visto que outros órgãos além dos departamentos de polícia tiveram a oportunidade de retificar as omissões e demora injustificada nas investigações, mas não o fizeram.

Conduziu-se o processo de forma tendenciosa. Havia concepção prévia de que as mortes foram causadas devido às ações das vítimas.

Assim, as diligências levadas a cabo foram de pouca relevância, traduzindo-se em uma negação do acesso à justiça e proteção judicial aos familiares das vítimas.

Sobre a violência sexual – estupros e tortura –, a Corte IDH considerou que houve falta de atuação estatal em relação ao ocorrido, não havendo oferecimento de recurso efetivo às vítimas. A ausência de investigação e de identificação e sanção dos responsáveis fez com que as mulheres vítimas sofressem, experimentando um sentimento de angústia, frustração e insegurança por anos – violando a integridade pessoal nesse contexto em que a violação se protrai no tempo.

Observa-se, portanto, que o foco do caso é as violações de garantias judiciais, da proteção judicial e do acesso à justiça – também com recorte de violência de gênero. Sua maior relevância reside nos parâmetros interamericanos definidos em termos de investigação de uma violação de direitos humanos decorrente do uso ilegítimo da força policial, sobretudo em execuções extrajudiciais – que são a maioria dos casos do Brasil na CIDH, conforme denúncias estudadas por membros da Clínica IDH.

Então, à luz das garantias judiciais – apontando ainda na argumentação parâmetros de uso da força policial que devem ser voltados para garantir a proporcionalidade, legalidade e necessidade –, a Corte IDH limita o uso da força policial e coloca como causa das violações o procedimento investigativo não independente conduzido pelos agentes estatais. Com isso, revela-se e condena-se um problema endêmico da estrutura institucional da polícia: extremamente punitivista, que demonstra a desigualdade social em diversas camadas e recortes, bem como as violações de direitos humanos já intrínsecas às operações em favelas, mascaradas com o argumento de combate à violência urbana.

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